11 de janeiro de 2010

"Não Se Aceitam Devoluções"

[excerto de artigo]

Por Quê Comprar?

Que espécie de pergunta traiçoeira é esta? Não somos nós caçadores e recolectores? Não estamos nós antropologicamente predispostos a fazer uma comprazita na Lowe's ou na Best Buy mesmo que os nossos orçamentos estejam nas lonas? Pense-se no PIB e no desemprego. É nosso dever patriótico pensarmos em escala macro e injectarmos dinheiro na economia — especialmente este mês [Dezembro], a altura mais sagrada do ano para fazer compras. Por outro lado, talvez seja nosso dever cívico reduzir as despesas supérfluas ou, caso não consigamos controlar-nos, pelo menos desafiarmo-nos a doar mais a instituições de beneficência ou para acção política. Compremos menos vales-prenda nesta época e gastemos o dinheiro em sopas dos pobres, santuários de elefantes ou alguma outra causa filantrópica. (…)

Alto e pára o baile. Quando é que fazer compras ficou assim tão impregnado de consequências económicas e morais?

Foi desde que fazer compras se tornou mortal quando um empregado da Wal-Mart morreu espezinhado no ano passado durante a Sexta Feira Negra, o frenesi ritualista de compras realizado no dia seguinte ao feriado da Acção de Graças [nos EU celebrado na última quinta-feira de Novembro]. Foi desde que o [índice bolsista] Dow, que caiu a pique no ano passado, se tornou o nosso electrocardiograma nacional. Foi desde que o desemprego atingiu dois dígitos. Nos velhos tempos — por volta de 2006 — fazer compras parecia tão simples e despreocupado. Comprávamos cada vez mais e endividávamo-nos cada vez mais. Agora o acto primordial de fazer compras é acompanhado de bagagem política, psicológica e, sim, ética (para não dizer que parece sempre custar dinheiro).

Robbie Blinkoff, um antropólogo de Baltimore que realizou um estudo sobre o consumismo e a psique do comprador moderno, diz que esta mudança é nada menos do que uma crise cultural. No passado Outono, o seu Context-Based Research Group estudou os hábitos aquisitivos e as atitudes consumistas em cinco cidades, incluindo Baltimore. As entrevistas e as pesquisas revelaram uma mudança tectónica nos nossos hábitos de consumo. O Sonho Americano estava morto; as pessoas não mais podiam dar-se ao luxo de projectar as suas aspirações numa casa maior, num carro novo, num gordo plano de poupança-reforma. Blinkoff enquadra o assunto como uma pergunta antes-e-depois:

Antes: Por que comprar? "Compro, logo existo".

Agora: Por que comprar? "Compro porque vivo numa sociedade de consumo e preciso de coisas, mas isso não me define".

"É um atingir da maioridade," diz Blinkoff. "As pessoas estão a compreender as suas vidas enquanto consumidores".

Este movimento começou no ano passado, quando a economia estava em completo desmoronamento. Os investigadores da Context decompuseram este processo, e este atingir da maioridade, em cinco fases semelhantes às do luto, à medida que o “Homo Economicus” — uma criatura "consumida pelo consumismo" — foi miraculosamente transformado no mais esclarecido "Consumidor com os Pés Assentes na Terra", que vive dentro dos seus meios e compreende os conceitos de endividamento e poupança. Na terceira fase desta transformação, diz Blinkoff, o comprador passa do consumismo pessoal para o colectivo, o qual enfatiza as relações familiares e comunitárias ao invés de apenas a satisfação de caprichos materiais pessoais. Na quarta fase, os consumidores começam a "descoisificar" as suas vidas, vendendo ou oferecendo as posses que têm em excesso. (…)

— Rob Hiaasen, in "No returns", publicado em The Urbanite Magazine

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