17 de janeiro de 2010

"Salvem os Nossos Pássaros" (Margaret Atwood)

[excerto de artigo]

(…) Eis algumas estatísticas: Nos Estados Unidos, as linhas eléctricas matam entre 130 e 174 milhões de pássaros por ano — muitos deles aves de rapina como falcões, ou aves aquáticas cuja envergadura de asas pode tocar em dois cabos quentes ao mesmo tempo, resultando em electrocução, ou que se chocam contra as linhas elécricas finas sem as ver (pense-se em cordas de piano). Automóveis e camiões colidem com pássaros e matam entre 60 a 80 milhões anualmente nos Estados Unidos, e os edifícios altos — em especial aqueles que deixam as luzes ligadas à noite — são um perigo muito grande para os pássaros migratórios, levando a cerca de entre cem e mil milhões de mortes de pássaros anualmente. Acrescentem-se as torres de comunicação iluminadas, que matam também um grande número de morcegos, cada uma podendo ser responsável por tantas quantas 30.000 mortes de pássaros numa noite má — temos pois 40 a 50 milhões de mortes por ano, e destinadas a duplicar à medida que são construídas mais torres. Os pesticidas agrícolas matam directamente 67 milhões de pássaros por ano, com muito mais mortes resultando de toxinas acumuladas que convergem no topo da cadeia alimentar, e da fome, à medida que desaparece o alimento normal dos insectívoros. Os gatos dão cabo de cerca de 39 milhões de pássaros apenas no estado de Wisconsin; multiplique-se isso pelo número de estados da América, e façam-se então os cálculos para o resto do mundo: os números são astronómicos. Há então os efluentes das fábricas, os derramamentos de petróleo no mar e nas praias, os compostos químicos desconhecidos que estamos a deitar na mistura. A natureza é prolífica, mas não está a conseguir acompanhar tais níveis de mortandade, e as espécies de aves — até mesmo espécies outrora comuns — estão a cair a pique em todo o mundo.

Mais uma estatística: segundo Al Gore, 97% dos donativos beneficentes vão para causas humanas. Dos restantes 3%, metade vão para animais de estimação. Isto deixa 1½% dedicado ao resto da natureza — incluindo os oceanos assoberbados de crises, a terra sofrendo de erosão, seca ou inundações, e a  biosfera em retracção da qual dependem as nossas vidas. Quão loucos somos? Parecemo-nos muito com aqueles desenhos animados antigos nos quais a personagem tolinha está a cortar o mesmo ramo da árvore no qual se senta, enquanto por baixo dela está uma queda a pique sem fundo. Faz-nos querer enfiar a cabeça na areia, tal como — aparentemente — faz toda a gente, e limitarmo-nos a comer muito, ver filmes antigos do tempo antes de as coisas se terem tornado tão assustadoras, e ir às compras. Ou, como James Lovelock continua a avisar-nos: aproveitem a coisa enquanto puderem, o que quer que seja "a coisa", pois ela não irá durar muito mais tempo. (…)

— Margaret Atwood, in "Act now to save our birds", publicado em The Guardian

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