11 de janeiro de 2010

"Tratando do Jardim da Tecnologia"

[excerto de entrevista com Kevin Kelly]

(…) A profundidade das raízes da tecnologia ultrapassa a cultura humana. Elas estendem-se, entrelaçadas, mesmo até ao Big Bang. A tecnologia é um exemplo — tal como a vida e a inteligência — de um sistema extrópico, um sistema que se alimenta de entropia para construir ordem, e não apenas ordem, mas ordem auto-amplificadora dotada de uma complexidade e profundidade explosivas. Os sistemas extrópicos criam ainda mais entropia no processo — isto é, a energia percorre o sistema a uma taxa aumentada de rapidez e densidade. É esta é definição dos sistemas auto-sustentáveis, tais como os organismos vivos. Há uma continuidade desde o início do universo, o qual se está a expandir para o exterior e a criar espaço para permitir que a diversidade floresça.

O que temos é uma tendência a longo prazo para uma crescente diversidade, complexidade e especialização — todas características dos sistemas auto-sustentáveis. Pode tratar-se de uma galáxia ou de um sol ou da inteligência. A densidade energética resultante é tecnologia. Uso o termo "O Technium". Uma galáxia é um sistema composto de tecnologias individuais, complexas bastante para terem as suas próprias qualidades de auto-sustentação, incluindo a autopreservação. Uma galáxia autoperpetua-se e está em autocrescimento. Poderia dizer-se que os seres humanos são os órgãos sexuais da tecnologia — que somos necessários para a sua sobrevivência. Mas a tecnologia tem inércia, prioridades, tendências e preconceitos próprios.

P: Para além de se reproduzirem, qual é o propósito destes sistemas?

KK: Estes sistemas são a evolução em evoluçâo. São graus crescentes de liberdade. E esta é a parte teológica — temos o jogo infinito. O jogo é prolongar o jogo, de modo ao jogo continuar. O jogo é continuar a mudar a natureza da mudança. E esse jogo infinito é, na minha opinião, o sagrado. Joga-se não para se ganhar mas para se continuar a jogar, de modo a dar espaço a todas as expressões da verdade, do bom e do belo. Estamos a abrir o mundo à possibilidade. Todas as crianças nascidas hoje na Terra têm alguma mistura particular de genes e de ambiente, de capacidade e inteligência a libertar. O jogo é sobre tentar educar esse indivíduo de modo a ele assumir uma posição em que o seu potencial e a sua possibilidade possam ser maximizados. E a tecnologia é o instrumento.

P: Falou sobre o que teria acontecido a Beethoven se ele tivesse nascido antes da invenção do piano…

KK: Isso ajuda-me a pensar nas pessoas nascidas hoje que possam carecer de alguma tecnologia que lhes permitiria atingirem o seu melhor. É isso que a tecnologia é na acepção mais vasta — a descoberta de potencial e de possibilidade.

P: Mas as ferramentas não são criatividade.

KK: A um nível profundo, o acto de descoberta e o acto de criação são idênticos. Os passos que daríamos para descobrir algo são exactamente os mesmos passos que daríamos para fazer algo. De modo que se poderia dizer que Edison descobriu a lâmpada eléctrica e que Newton inventou a gravidade. (…)

— Andrew Lawler, in "Tending the Garden of Technology", publicado em Orion Magazine

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