11 de janeiro de 2010

"O Regresso dos Fungos"

[excerto de artigo]

Nas florestas primordiais do Pacífico Noroeste cresce um cogumelo bolboso de ar pré-histórico chamado agárico [Fomitopsis officinalis]. Prefere colonizar abetos de Douglas centenários, crescendo para fora dos seus troncos como uma feia verruga num dedo. Quando conheci Paul Stamets, um micólogo que passou mais de três décadas a colher, a estudar e a tripar em cogumelos, ele descobrira apenas dois destes fungos invulgares, de cada vez acidentalmente — ou, como poderia dizer, por intervenção divina.

Stamets acredita que decifrar os segredos do agárico poderá ser tão importante para o futuro da saúde humana quanto a descoberta por Alexander Fleming, há mais de 80 anos, das propriedades antibióticas do bolor penicillium. De modo que, num ensolarado dia de Julho, Stamets está de partida para uma viagem ao longo das ilhas costeiras da Colúmbia Britânica meridional, na esperança de ensacar mais alguns dos fungos ameaçados, antes que a desflorestação ou as alterações climáticas mudem irreparavelmente os ecossistemas que são o seu lar. O agárico poderá estar pronto a salvar-nos — mas primeiro poderemos ter de o salvar a ele. (…)

Alguns meses antes, o Instituto para a Investigação da Tuberculose, da Universidade de Illinois-Chicago, enviou a Stamets a análise que fizera de uma dúzia de estirpres de agárico que ele cultivara no seu laboratório. O Instituto descobriu que o fungo era extraordinariamente activo contra a XDR-TB, um tipo raro de tuberculose que é resistente mesmo aos mais eficazes tratamentos farmacêuticos. O Projecto Escudo Biológico, o programa de biodefesa do Departamento da Saúde e de Serviços Humanos, descobriu que o agárico é altamente resistente a muitos vírus de gripe, incluindo, quando combinado com outros cogumelos, a gripe das aves. E uma semana antes da viagem, o Centro Nacional para a Investigação de Produtos Naturais, um laboratório financiado com verbas federais na Universidade do Mississipi, concluiu que o fungo mostrava resistência a vírus ortodoxos, incluindo a varíola — sem qualquer toxicidade aparente. (…) Actualmente, o agárico está a ser testado para ver se pode também combater o vírus suíno H1N1.

"Quando referimos os cogumelos às pessoas, elas pensam em cogumelos mágicos ou comestíveis. Reviram os olhos," lamenta Stamets. Que um simples e humilde fungo possa lutar contra doenças virulentas como a varíola e a tuberculose poderá parecer estranho, até percebermos que, embora o reino animal se tenha separado do reino dos fungos há cerca de 650 milhões de anos, os seres humanos e os fungos partilham ainda quase metade do seu ADN, e são susceptíveis a muitas das mesmas infecções. (Referir-se aos fungos como "os nossos antepassados" é um dos muitos biscoitos retóricos com que Stamets gosta de alimentar os seus públicos.) (…)

As experiências de Stamets geraram muitas descobertas surpreendentes sobre os cogumelos e o micélio, a rede semelhante a teias de aranha, amiúde oculta, que os gera. Ele demonstrou que o micélio do cogumelo-ostra pode restaurar mais eficazmente os solos poluídos por petróleo do que os tratamentos convencionais; numa experiência de oito semanas, o fungo decompôs 95 por cento dos hidrocarbonetos numa faixa de terra ensopada com óleo diesel. Usou sacos de aparas de madeira inoculados com micélio-ostra como filtros para proteger habitats fluviais de poluentes tais como pesticidas agrícolas contaminados com bactérias coliformes. Recentemente, provou que podia produzir-se etanol celulósico com açúcares extraídos de fungos em decomposição.

Insistindo ser apenas uma "voz do micélio", Stamets diz que não pode realmente assumir o crédito pelas suas descobertas sobre um reino extraordinariamente diverso e evolutivamente bem sucedido que a ciência moderna praticamente não explorou. Todavia, ao longo dos últimos quatro anos, requereu vinte e duas patentes e quatro foram-lhe outorgadas. "Estou a lutar contra as malvadas empresas farmacêuticas, e elas tentarão roubar-nos. Não tenho ilusões quanto a isto," diz. "É verdadeiramente uma situação de David contra Golias". (…)

— Andy Isaacson, in "Return of the Fungi", publicado em Mother Jones

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