11 de janeiro de 2010

"Debaixo da Floresta"

[excerto de post]

A devastação gradual da Amazónia — o derrube de milhares de quilómetros quadrados de floresta, a eliminação da selva — produziu, paradoxalmente, uma das maiores descobertas arqueológicas: uma vasta e complexa civilização antiga. Em áreas desmatadas da bacia superior do Amazonas, os investigadores assinalaram recentemente, usando imagens de satélite, uma enorme rede de terraplanagens, incluindo estradas e estruturas alinhadas geometricamente, construídas por uma civilização até agora desconhecida. Segundo um novo relatório publicado na revista Antiquity, o arqueólogo Martii Pärssinen e outros cientistas documentaram mais de duzentas e dez estruturas geométricas, algumas das quais poderão datar de há tanto tempo quanto o terceiro século da nossa era. Espalham-se por uma área que abarca mais de duzentos e cinquenta quilómetros, indo desde o norte da Bolívia até ao estado do Amazonas no Brasil.

Tal como escrevi anteriormente em The New Yorker e no meu livro “The Lost City of Z,” durante séculos a maioria das pessoas assumiu que a Amazónia era uma floresta primordial, um lugar onde não havia, como Thomas Hobbes descreveu o estado da Natureza, “nenhumas Artes; nenhumas Letras; nenhuma Sociedade; e o que é o pior de tudo, medo contínuo, e perigo de morte violenta". Embora os antigos conquistadores tivessem ouvido os índios falar de uma civilização amazónica fabulosamente rica, a que chamaram El Dorado, as buscas que dela se fizeram acabaram invariavelmente em desastre. Milhares de pessoas foram aniquiladas pela doença e pela fome. E após um balanço de morte e sofrimento digno de Joseph Conrad, a maioria dos estudiosos concluiu que o El Dorado não passava de uma ilusão. De facto, os cientistas acreditavam que as condições implacáveis na selva eram simplesmente inóspitas demais para sustentar uma grande população, que é um precursor de qualquer sociedade grande e complexa. Ficou famosa a classificação da região como um "paraíso falsificado", feita por Betty Meggers, o nome mais influente da arqueologia do século XX.

Nas primeiras décadas do século XX, o explorador britânico Percy Harrison Fawcett desafiou esta ideia prevalecente. Ao explorar e cartografar em grande medida a mesma área onde as ruínas foram recentemente descobertas, informou ter encontrado grandes montes de terra repletos de cerâmica antiga e estaladiça. Enterrados sob o solo da selva, afirmou, havia também vestígios de canais e estradas. Baseado nestes e noutros indícios, insistiu que a Amazónia contivera outrora grandes populações, e pelo menos uma, se não mais, civilizações avançadas. Apesar de ser desconsiderado e ridicularizado como tolinho, em 1925 Fawcett partiu em busca do lugar, que baptizou "Cidade de Z". Ele e a sua expedição, incluindo Jack, o seu filho de vinte e um anos, desapareceram então para sempre — um destino que pareceu confirmar a loucura de uma tal demanda.

No decurso dos últimos anos, porém, tem surgido evidência crescente de que quase tudo que outrora se acreditava em geral sobre a Amazónia e o seu povo estava errado, e que Fawcett foi de facto presciente. (…)

— David Grann, in "Under vthe Jungle", publicado em The New Yorker

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